30 de ago. de 2020

MARÉ NADA

Meu caro, minha cara.


O solitário ipê amarelo se ergue sobre o campo forrado de palha. Vejo isso enquanto o sol bate no meu capacete e o vento tenta destruir a minha trança. 

Os tucanos voam longe dos gaviões e urubus, mas cavalos e burros dividem as poucas sombras no pasto como iguais.

As vacas passeiam vagarosas por entre as palmeiras de buriti, naquela fazenda com a casa grande, os currais e as casas de colônia destelhadas.

Chegamos cansados na cidade que todos dizem ser "uma beleza", mas ao final do caminho, não queríamos beleza: queríamos sombra, comida, descanso.

Não tinha nada disso que prestasse.

Perto do anfiteatro, paramos numa sombra pequena, enquanto via os cardumes de peixes passeando na praia interditada. Por um momento, pensei que as pedras aparentes estavam assim por causa da maré baixa, mas numa represa não existe maré baixa ou alta. Também não tem onda. Aliás, elas só se formam quando alguma lancha passa. Aí até dá pra sonhar com ondas quebrando na praia.

"Não gosto desse barulho".

"Que barulho?"

"Esse aí, de onda quebrando. Prefiro lago, lagoa, represa, com água calminha, para entrar e se refrescar, andar de caiaque sem medo de levar caldo".

"Ah... Eu já gosto é do mar. Esse barulho de onda quebrando é lindo! Fora o cheiro... Eu tenho saudades do cheiro".

Concordamos em discordar. Eu acho graça. Não precisamos concordar com tudo para nos darmos bem. E tá tudo bem.

Porém, estaria muito melhor se a água fosse salgada, o cheiro fosse de maresia e houvesse maré...


Rifaina, 30 de agosto de 2020.



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