13 de jul. de 2023

CALDO VERDE E CANJA

Meu caro, minha cara...


A conta chegou. A água bateu na bunda. Não tem mais para onde correr.

Após dois anos e meio de vazio e comfort food, minha tristeza só tem a companhia dos 20 e poucos quilos que ganhei nesse período. Um ganho que não compensa nenhuma perda...

Mas, como eu disse, a conta chegou: pressão, glicemia, colesterol, dor. Cheguei ao ponto de me olhar no espelho e ver a pior versão de mim mesma - e a cereja desse bolo de merda é que essa versão lembrou muito minha mãe...

(e lá vamos nós tratar disso na terapia, né?)

Tirei as férias para correr atrás de médico (correr, não. Andar, pois não consigo correr mais). Ainda estou fazendo essa Via Crucis e esta semana foi dedicada ao endócrino e à nutricionista.

Resultado? A água não só bateu na bunda, mas deu aquela lambida gélida no traseiro, sabe? Comprei o leite de soja zero e o biscoito de arroz que a nutricionista mandou e respiro fundo dizendo para mim mesma que tudo isso é para meu bem.

(E fui chorar as pitangas com a minha terapeuta...)

Hoje, fonte geradora de grande ansiedade, a comida é um dos meus maiores prazeres e agora é fruto de grande culpa. E no decorrer da conversa, fui para um tempo em que a comida era só alegria.

Um tempo em que minha mãe cozinhava e ela era a melhor cozinheira do mundo e tudo o que eu comia era gostoso e tinha uma história por trás.

Como está meio frio esta noite, lembrei das sopas que ela fazia, em especial o caldo verde. Descrevi o passo a passo, sentindo o cheiro do paio refogado, da cebola e do alho fritando, a couve fininha murchando no fundo da panela e a batata cozinha e amassada se juntando ao bando. Ao final, azeite.

Com um bom pedaço de pão, essa sopa é dos deuses...

E ela sabia disso.

E o caldo verde me levou ao Almeida, com as paredes de azulejo verde água cobrindo tudo do chão ao teto, piso de tijolão vermelho e aquela cadeira laranja encardida, com os pés de ferro.

Toda vez que tinha aniversário, meu irmão e eu enchíamos o rabo de coxinha, refrigerante e maravilha, mas meus pais deixavam um espacinho do estômago para ir ao Almeida depois da festa e pedir um caldo verde ou canja. Lembro dos dois comendo, o Ricardo e eu brincando com o secador de mão de ar quente, enquanto na mesa ao lado tinha um velho barrigudo com a camisa aberta até o umbigo discutindo sobre o Santos com o garçom de calça preta e camisa branca, enquanto chegava o pessoal que saía do teatro municipal depois de uma apresentação, seguido por um povo emendando a balada por lá e por último (mas não menos importante), duas travestis jantando, com o lápis de olho derretido, caras de cansada, sabendo que assim que comerem, voltarão ao trabalho.

A canja era coisa de criança, era sopa de criança. Dela eu não gostava muito, não achava que ela acertava todas as vezes, mas comia mesmo assim, porque mesmo não tirando um 10, ela sempre passava de ano. Meus pais diziam que, quando éramos bebês, ela fazia uma canja com bastante arroz, frango, tomate, cenoura e ovo. Fazia para levar nos restaurantes que visitávamos, para gente não ter que comer a comida do restaurante e passar mal com alguma coisa.

(Eles eram desses...)

Volto para as sopas de adulto, volto para a situação em que me encontro hoje. Ao final da sessão, volto para a lista de coisas que tenho que fazer, comprar e comer para abandonar as coisas ruins que conquistei.

Quem diria que perder seria motivo de orgulho, não é mesmo?

Perder com parcimônia, com resignação.

Não tem mais para onde correr.

Terei que andar.

(e arriscar fazer o caldo verde que minha mãe fazia... sopa de adulto...)


Ribeirão Preto, 13 de julho de 2023.




Nenhum comentário:

Postar um comentário