22 de ago. de 2016

PLAQUINHA.

Meu caro, minha cara,


Indo para o médico agora à tarde, tive que passar pelo centro da cidade.
Entre um semáforo e outro, lá na Baixada, pude ver a mistura, um ao lado do outro, de botequinhos e portinhas discretas (boa parte delas, prostíbulos).
Entre um e outro vi uma portinha que tinha uma placa sobre ela, de ferro fundido e com jeitão de antiga. Dizia, simplesmente, "Residência Familiar".

Pelo jeito da plaquinha, acima do batente da porta, esta residência familiar deve existir ali há muito tempo. Deve ser do tempo em que ainda haviam outras residências familiares, em um centro de cidade com comércios familiares. As pessoas que ali moravam deviam sair na rua e ver rostos familiares. A rotina deveria lhes ser familiar.

E o tempo deve ter passado (aliás, o tempo passou), o centro da cidade mudou, os vizinhos se mudaram, a vizinhança mudou, mas a residência familiar ficou.

De tão descaracterizada e desarticulada da sua nova realidade, a residência familiar teve que colocar uma plaquinha no batente de sua porta avisando o que era, sob o risco de, por falta de aviso, ser confundida de função com a nova ocupação dos seus vizinhos.
Não sei se fico triste ou feliz em ver aquela placa.
Aquela placa que mostra que as coisas mudam e que há coisas que nunca mudam.
Aquela placa que anuncia o imutável, para o bom e para ruim.
Aquela placa de ferro, com jeito de placa de cemitério, que avisa que ainda há algo vivo. Se não de verdade (vai que aquela residência não seja mais familiar) ao menos na ideia.
...
São momentos fugazes assim que me fazem parar para pensar que algumas idéias devem mudar muito para que permaneçam as mesmas...

Ribeirão Preto, 22 de agosto de 2016.

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