19 de dez. de 2019

"VAI, MACARRÃO!"


Meu caro, minha cara.

Isso foi o que ouvi quando voltava para o carro depois de sair do ortopedista.

Quem gritou foi um carroceiro. Sabe o tipo? Pele da cor e da textura de tronco de flamboyant, barba branca e retorcida, cantando alto pelas ruas, magro e rijo.

Aposto que tinha um percentual de gordura corporal muito menor do que muito crosfiteiro...

E o "Macarrão"?

Macarrão era o cavalo que puxava a carroça, abarrotada de caixas desmontadas de papelão.

Esperei eles passarem, dei seta e sai. Na esquina, eu ia virar à esquerda. Eles também viraram. Eles foram primeiro, depois um caminhãozinho e uns dois carros. Macarrão ia na frente, lento como o trânsito que estava à frente dele.

O motorista do caminhãozinho ficou puto com Macarrão e o carroceiro. Na esquina seguinte, ele acelerou e cortou Macarrão pela esquerda. O baú machucou a copa de uma árvore que não tinha nada a ver com a história.

Pouco prestou a manobra: como eu disse acima, era o trânsito que estava lento. O caminhãozinho parou logo em seguida. O carroceiro parou de cantar e ficou mexendo com o motorista. "Não tá com pressa? Então corre agora! Vai, apressado!"

Não usou nenhum palavrão...

Tudo isso me deixou nostálgica. Pois quando era criança haviam muitos carroceiros com seus pangarezinhos magrelos pela cidade.

Alguém dito "antenado" poderia dizer que eles são "seres analógicos em um mundo digital"...

Mas eles são tão analógicos quanto o velhinho que atravessa a rua no farol fechado, usando boné e sapato social.

Tão analógicos quanto a minha menstruação, que chega antes e depois da data marcada no meu aplicativo.

Tão analógicos quanto a mulher grávida que segurava a barriga enorme enquanto deixava claro no rosto que sentia dor. Ao entrar no carro que estava parado ao meu lado no sinal fechado, disse ao marido: "Veio mais uma contração"...

Tão analógicos quanto o violão que escuto agora.

Tão analógicos quanto o macarrão com molho de atum que há tempos eu não faço e me peguei morrendo de saudades de fazer e comer...

Ribeirão Preto, 19 de dezembro de 2019.


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