20 de jan. de 2020

COMO QUE EU FUI PARAR NA TERAPIA.

Meu caro, minha cara.

Eu não lembro bem se foi uma sexta ou num sábado, mas sei que foi no 2º ano de faculdade e estava frio.

Na época, eu era estagiária no laboratório de informática e aquele era meu primeiro trabalho remunerado na vida. Era monitora do laboratório de manhã e, à tarde e à noite, estudava na faculdade.

Em suma: saia de casa antes das 7h e voltava pra casa depois das 23h.

E isso não era o pior: eu morava com uma moça que se revelou uma tremenda megera pirracenta, que encanava com cada "falta" minha. Para ela, chegar depois das 23h e cansada não era desculpa para eu não limpar o banheiro numa quarta feira à noite com 10° de temperatura...

Eu ainda namorava essa época. Ou pelo menos era o que ele me fazia acreditar: já havia se formado e estava na cidade dele, estudando para concursos. Por telefone ele dizia quee estávamos juntos, mas eu sabia que, no coração, estávamos em planetas diferentes.

Só que quem fez isso não foi a distância. Foi ele. No dia 17 de novembro do ano anterior.

Eu ainda não havia me tocado a respeito, mas sentia isso no meu corpo inteiro.

Pois bem: minha vida não estava lá nos seus melhores dias e a única coisa que eu queria era sumir. Só levantava de manhã cedo porque tinha que ir para o estágio e ganhar a bolsa para me sustentar. Tinha que ir para as aulas para ser a primeira neta da minha avó a ter diploma.

Quantas "responsabilidades"...

E chegou o dia, que eu não me lembro se era sábado ou sexta. Sei que era à tarde, estava no 2º ano, estava nublado e frio.

Mesmo cansada, eu tinha dificuldades para dormir. Mesmo tomando remédios para domir, só conseguia "descansar" cerca de 5 a 6h por noite.

Chegou o final de semana e eu não sabia existir.

Comecei a fazer contas: quantos comprimidos eu precisava tomar para dormir um final de semana inteiro?

Acho que foi numa 6ª feira isso... pois eu contei 3 noites e 2 dias: 60h no total.

Precisava tomar 10 comprimidos.

Estava retirando os comprimidos da cartela quando me fiz a seguinte pergunta: "e se tiver algum efeito colateral por causa dessa quantidade?"

Eu não queria ter que acordar durante o final de semana. Eu queria dormir e acordar na 2ª feira seguinte para ir ao estágio...

Nem para acordar, tomar outro comprimido e dormir eu estava com paciência.

Só queria apagar a minha existência e ressucitar no terceiro dia.

Não vi a bula do remédio. Não precisei. Me assustei com o que poderia acontecer, com o que eu achava que poderia/deveria acontecer se eu fizesse aquilo.

Não lembro para quem eu pedi ajuda, mas na 2ª feira eu fui até a clínica social da faculdade e pedi uma avaliação.

Somando todo o tempo que eu fiz/faço terapia, já foram 12 anos.

Hoje eu entendo o que aconteceu.

Hoje não tem tanto lixo na minha vida.

(...)

Faz quase 19 anos desde aquele dia, em que eu estava disposta a deixar de existir, mesmo que por alguns dias.

Escolhi existir e não tive alívio algum. Foi foda. Céus, como aquilo foi foda... Ninguém tá preparado pra isso...

Mas agora eu entendo o que aconteceu.

E alívio de verdade é não ter que carregar o lixo dos outros...

Ribeirão Preto, 20 de janeiro de 2020.


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