23 de abr. de 2020

ROTA DE FUGA

(A estrela mais brilhante só pode ser vista da estrada escura e no meio do nada...)

Meu caro, minha cara.

Tomei banho, vesti uma calça, a blusa que ele não gosta, chinelos, e saí.

“Vou sozinha”, disse.

Não queria companhia. Ou testemunhas.

Não queria um par de olhos me medindo, medindo a altura do som do meu carro, os ponteiros do velocímetro ou do contagiro.

Adoro dirigir à noite. Se for com o vidro aberto e um rock nas alturas, melhor ainda...

Pego a Anhanguera e desço. Não muito. Corto a cidade fofa e pego outra estrada. Ela é curta porque eu corro muito. Foi correndo que eu fiz a primeira curva brava. Foi correndo que eu pisei no freio e correndo voltei ao acelerador.

Quando não vinha ninguém, desligava os faróis. Na noite preta do asfalto solitário, a estrela mais brilhante brilhava.

Foi quase no fim do caminho que tudo rosnou. O carro e eu. A garganta e a boca explodiram junto com a cabeça, num típico grito de mulherzinha indefesa de filme de terror B.

Agora, o motor esfria, a garganta arranha e eu, espero o lanche ficar pronto.

Na rua iluminada por refletores de halogênio, a estrela mais brilhante brilha longe dos meus olhos.

Ribeirão Preto, 23 de abril de 2020.



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